Por Alziro da Motta Santos Filho*
Mesmo as empresas familiares precisam de uma gestão profissional para se certificarem de que o desenvolvimento da atividade empresarial está levando em conta, não só o interesse dos sócios, mas também, todo e qualquer stakeholder, ou seja, qualquer pessoa que possa ser afetada, de alguma maneira, pelas atividades da empresa, como colaboradores, locatários, fornecedores, clientes e herdeiros. Sempre visando dar continuidade ao negócio.
A separação entre a pessoa física dos sócios (família) e o controle da empresa é uma das funções da governança corporativa. De maneira geral, governança corporativa é o sistema de regras, práticas e processos pelo qual uma empresa é dirigida e controlada.
Para isso, precisa estar no radar dos patriarcas das empresas familiares, ainda no auge do exercício de sua liderança, a utilização de mecanismos de governança corporativa para garantir a perpetuidade do negócio em benefício da família. Por exemplo:
i) A imposição de regras aos sócios e herdeiros determinando requisitos para integrarem a sociedade ou se tornarem seus administradores (e.g. graduação em administração, experiência profissional mínima, quórum especial de escolha do administrador familiar);
ii) A criação de comitês e conselhos de administração, cuja consulta se faça necessária para a prática de atos comerciais sensíveis e sirvam de uma antecâmara para ingresso na administração da sociedade (e.g. venda de bens cujo valor supere determinada soma);
iii) A estipulação de normas de transparência da gestão, como a emissão de relatórios periódicos a detalhar as atividades do período e a auditoria desses relatórios por profissionais do ramo.
Essas são algumas ferramentas que a governança corporativa disponibiliza para que uma empresa familiar prepare a sua sucessão, fora ou dentro do núcleo de herdeiros. Porém, um planejamento sucessório bem desenvolvido é aquele que se abre à revisitação periódica. A criação de regras e mecanismos não há de significar trancamento, engessando as capacidades dos afetados pelo planejamento, afinal, as suas preferências poderão ser alteradas com o passar do tempo.
A governança corporativa busca harmonizar o processo sucessório, conciliando os interesses dos sucedidos e dos sucessores, aplacando as expectativas exageradas ou incitando-as, na sua falta, dentro de um ritmo adequado, voltado a diminuir as assimetrias e tensões, tendo sempre em mira a preservação do negócio e das relações familiares.
A ideia primordial é preparar tanto psicológica, quanto profissionalmente os herdeiros acerca da sucessão da empresa. Essa preparação significa buscar dentre os herdeiros, o mais capacitado, ou com maior potencial, bem como, dar conforto psicológico aos demais de que o negócio estará em boas mãos e de que esta é a melhor opção disponível.
Pode-se também, chegar à conclusão de que a sucessão será apenas pelos direitos políticos e econômicos, sem que a administração seja ocupada pelos herdeiros. Neste caso, haverá uma profissionalização, com a saída da família da gestão da empresa. Mas, isso não significa que um negócio com gestores profissionais não demande atenção e preparo dos stakeholders. A constituição de organismos internos de controle de administração é mandatório, para que a família acompanhe de perto a evolução dos negócios.
A criação de conselhos consultivos de administração e fiscais, por exemplo, possibilitam que os herdeiros ganhem experiência de contato com o negócio e possam, eventualmente, demonstrar seus talentos. Assim como, permitem que os fundadores que já se afastaram da gestão, ainda possam contribuir com sua experiência e se manterem mentalmente ativos, para o bem do negócio.
Essas ferramentas possibilitam que os herdeiros se familiarizem com o negócio e convivam nesta atmosfera com os demais componentes do núcleo familiar, adquirindo assim, gosto e experiência, criando um solo fértil para o surgimento de uma nova liderança no seio da família.
A governança corporativa é implantada por meio de uma reestruturação societária, com planejamento sucessório, sem se descuidar do aspecto tributário. Este é um ato complexo, que exige diálogo seguro e profundo com diversos ramos do direito (societário, civil, familiar, sucessório e tributário), para que se possa utilizar de todas as engrenagens legalmente disponíveis a fim de adequar a empresa ao anseios da família, sem desviar os rumos do negócio.
*Alziro da Motta Santos Filho- OAB/PR- 23.217- Sócio fundador do escritório Motta Santos & Vicentini Advocacia Empresarial